Ilustração de Thomaz Simões e sua filha Eduarda (11 anos)
Em geral, indivíduos discriminadores têm dificuldade para lidar com suas próprias “estranhezas”, suas incompetências, fragilidades, limitações, diferenças e por isso repudiam os “espelhos” (constituídos pelos “estranhos” à sua volta) já que esses fazem aflorar seus medos e trazem no mínimo incômodo. No meio adulto encontramos uma imensa variedade de indivíduos discriminadores, especialmente em grupos em que se acirra a cultura da intolerância. Não é preciso pensar muito para se obter algum exemplo. Na verdade, quando a intolerância se desenvolve num meio social (grupo, família, comunidade, povo, país, planeta), ela tem origem no próprio indivíduo que não tolera, já que o que ele rejeita não é potencialmente as diferenças do outro, mas as suas próprias diferenças. Ou seja, o que ele julga diferente e inaceitável nele próprio, como por exemplo, as suas “dificuldades”, “escolhas”, “aspecto”, “desvios”, “vícios”, “desejos”, ele não suporta rever no outro.
No meio educacional, é esperado algum tipo de comportamento discriminador principalmente entre os adolescentes, mas especialmente preocupante, quando acontece entre as crianças antes dessa fase, quando ainda nessa nesse período de formação básica pode se tornar estruturante para o pensar e agir na fase adulta, que dissemina mais facilmente essa conduta.
A característica discriminadora adolescente pode ser maior ou menor, dependendo do grau de exigência a que esse jovem se impõe ou a ele é imposto. Em geral, adolescentes querem construir uma personalidade a partir do rompimento com os pais. O desejo de se constituir “maduro” e “independente” o torna intolerante às opiniões e condutas de seus mais antigos espelhos que são os seus pais; o que pode ser muito positivo, no caso das crianças que cresceram num meio discriminador. O que também não é obrigatório, já que por insegurança, alguns adolescentes são discriminadores potenciais, bastando que outros jovens apresentem sinais daquilo que ele luta para romper, como a própria imaturidade ou suas “deficiências”, que assim são sentidas por ele quando sua meta é a “perfeição”, palavra tão presente nessas gerações movidas pela matéria.
As conhecidas “panelinhas” adolescentes protegem grupos, num movimento de aceitação conjunta. Uma espécie de simbiose em grupo.
Nelas os jovens dividem tudo aquilo que não dão conta individualmente, já que os sujeitos que se desenvolvem dentro de cada um deles é ainda estranho e distante daquele “eu” minimamente por ele reconhecido até então. Quando isso ocorre em crianças mais jovens, vale prestar atenção ao modelo familiar que pode fazer a criança repetir as “regras de intolerância” da casa ou um nível de exigência que promove um enorme rigor consigo mesmo e por isso tende a querer ver o mesmo refletido no outro, seu espelho para ele se admirar.
Tentar atender aos delírios da sociedade é perder-se sem autorreconhecimento e defender-se dela todo o tempo, é embrutecedor. Esses
dois caminhos afastam a infância de quem ainda é criança e a espontaneidade e sensibilidade de quem já é adulto.
Aquela frase jargão: “mantenha a sua criança interior”, resumidamente nada mais é do um conselho para se manter verdadeiro e criativo.
A arte é a grande fonte. Sua característica democrática promove a revisão do pensamento intolerante e permite que se façam aproximações entre diferenças e diferentes pelo simples fato de serem as diferenças na arte, as grandes facilitadoras e até mesmo responsáveis pelos admiráveis resultados que se pode obter.
No processo artístico se as diferenças de consistência das tintas, as diferenças das cores, das linhas e dos materiais em geral, não forem aplicadas como recurso do fazer, tão pouco se faz arte.
São mesmo abstratos, estranhos e diferentes os critérios adotados para o que se pode chamar de arte, assim como são diferentes todos os indivíduos.
Na arte, assim como numa sociedade saudável, tudo se mistura e desse “caldo” surge o amor, a livre expressão, o aprendizado, a ética e o amadurecimento.
No universo de criação, técnicas e propostas que reúnam materiais igualmente diferentes, contrários, opostos e se possível aqueles que fazem misturas aparentemente absurdas, atuam simbolicamente representando as inúmeras inter-relações que podem ser feitas entre elementos considerados desarmônicos. Numa aula de artes a diversidade é um dos elementos estruturadores da atuação dos professores e nas atividades apresentadas deve estar sempre presente e ainda mais especialmente quando professores e alunos estão frente ao triste sintoma da rejeição. Abordagens sobre as diferenças entre extraordinário e ordinário, passando inicialmente por seus significados e contribuições para vida, são de grande ajuda.