Já fomos crianças e hoje se não nos lembramos mais, podemos observar as crianças que estão por perto de nós.
Quase todas quando ainda pequenas, encontram meios de acomodarem ou ao menos tornarem mais digestivos os momentos incômodos. Uma briga, um grito injusto, uma omissão, uma incompreensão, podem ser digeridos ou expelidos numa estória imaginada e representada entre objetos comuns: na terra ou na areia da praia, num desenho, na água ou numa pintura livre feita na escola.
Há, sem dúvida, situações que transcendem o simples indigesto e que mesmo deixando marcas, elas até se suavizam com a possibilidade do criativo.
Foi a nossa imaginação infantil ou a das crianças que observamos que permitiu elaborar os inevitáveis obstáculos tão próprios da vida. Foi o medo da bruxa que não gostava da branca de neve ou o medo de ser bruxa. Foi o desejo de pintar tudo de azul ou respingar de vermelho o papel branco, de riscar com raiva o lápis cera sobre um pedaço de tábua. Foi o buraquinho na terra, onde escondemos ou enterramos coisas, que nos alimentou e nos ajudou nesse percurso.
Não sei se vocês ainda se lembram, mas foi por volta dos oito anos, quando os códigos de ensino passaram a ocupar quase inteiramente nossas vidas, que a nossa imaginação foi perdendo espaço, até sucumbir entre números, provas, certos, errados e outros rigores da precisão. No entanto, a vida a partir daí não deixou de nos trazer situações imprecisas, por vezes difíceis de se decidir simplesmente se isso ou aquilo. Mas, onde ficaram os recursos trazidos pela natural criatividade dos primeiros anos e o que fazer quando ao invés da imprecisão criativa se tem apenas a missão de acertar num típico: É isso ou aquilo?
Não reclamem de ansiedade ou de desinteresse em seus filhos!
Afinal eles estão seguindo o comando, tentando “isso ou aquilo”, ou serem competitivos como espera deles essa sociedade do “venceu ou perdeu”. Talvez até já tenham desistido da competição por se sentirem fora do páreo.
Não reclamem de hiperatividade sem antes observar se ainda existe espaço na vida de seus filhos para brincarem e imaginarem por conta própria.
Não reclamem de incompetência para o aprendizado, porque educação sem arte faz a criança romper com a competência que ela traz e experimenta quando vem ao mundo. Educação sem arte, promove a impessoalidade, torna estéril o conhecimento e empobrece o raciocínio.
De que adianta crescer e passar a observar o mundo através de um olhar aprisionado, limitado?